segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Concepção e Engajamento das Forças Especiais do Exército dos EUA no Conflito do Vietnã (Parte 1)

Texto elaborado por Rodney Alfredo Pinto Lisboa.


Fotografia 1: Operador do 5th SFG-A (5° Grupo de Operações Especiais-Aerotransportado) interagindo com tropas sul-vietnamitas. (Fonte: THOMPSON, 2002, p. 12). 

Para que se possa contextualizar o histórico das Forças Especiais (FEsp) do Exército dos EUA, primeiramente é necessário esclarecer alguns aspectos acerca da terminologia. Para a sociedade civil e para considerável parcela da sociedade militar, pouco familiarizadas com o ambiente das unidades militares de elite, o termo Forças Especiais é empregado de forma análoga à expressão Operações Especiais (OpEsp). Apesar da similaridade, uma vez que ambas estão relacionadas às atividades militares de natureza não convencional, a definição contextual delas é absolutamente distinta. As OpEsp englobam uma ampla diversidade de tarefas, cuja singularidade, estão além das capacidades operacionais das tropas convencionais. Por sua vez, as FEsp dedicam-se à categorias específicas de OpEsp que enfatizam o método de Ação Indireta (quando não há contato direto com as forças inimigas) no intuito de moldar o ambiente operacional e/ou prover suporte (assessoramento/treinamento) para forças militares ou paramilitares de nações amigas envolvidas em situações de crise e/ou conflito.
Embora a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) balize o emprego sistemático de OpEsp (Operações Especiais), foi durante a Guerra Fria (1947-1991) que as FFAA (Forças Armadas) norte-americanas estabeleceram o conceito de emprego para suas FEsp. O choque de ideias instaurado após a Segunda Guerra entre os blocos capitalista (liderado pelos EUA) e socialista (liderado pela URSS [União das Repúblicas Socialistas Soviéticas]), acirrou os ânimos instigando uma atmosfera de antagonismo ideológico ao redor do mundo. Em alguns casos, essa incompatibilidade levou ao desencadeamento de lutas regionais (guerras de conquista) ou violentas manifestações de insurgência (rebelião contra uma autoridade constituída). Essa atmosfera belicosa conferia aos Estados vinculados a ambos blocos a necessidade de dispor de organizações aptas a executar ações clandestinas (realizadas de forma sigilosa, distante da opinião pública e sem denunciar o envolvimento do país que as patrocina) nas regiões globais onde fossem solicitadas.


Figura 1: Oficiais do Exército dos EUA considerados como fundador (McClure) e co-fundadores (Fertig, Volckman e Bank) das FEsp norte-americanas. (Fonte: Elaborado pelo autor). 

Nos EUA, coube ao Brigadeiro General Robert Alexis McClure, comandante da OPW (Divisão de Guerra Psicológica do Exército [Office of Psychological Warfare]), a iniciativa de promover a criação de unidades vocacionadas para este fim. Convicto de suas percepções, e enfrentando a resistência da ala conservadora da Força Terrestre (cujo pensamento estava enraizado nos conceitos da guerra clássica e direcionado para o contexto da guerra nuclear), em 1951 McClure acabou por instituir e vincular uma Seção de Operações Especiais ao órgão que comandava. Liderada pelo Coronel Wendell Fertig, a Seção de Operações Especiais (Special Operations Section) da OPW passou a operar tendo os Coronéis Russel William Volckman e Aaron Bank, respectivamente, como Oficial de Planejamento e Diretor de Operações. Veteranos da Segunda Guerra, tanto Fertig, quanto Volckman e Bank, haviam prestado relevante contribuição na assessoria a movimentos de guerrilha que se opunham às tropas do Eixo nos teatros da Europa e do Pacífico. Adicionalmente, foram incorporados à Seção de Operações Especiais antigos integrantes da OSS (Agência de Serviços Estratégicos [Office of Strategic Services]), serviço de inteligência dos EUA durante a Segunda Guerra, e dos Merrill`s Maraunders, tropa norte-americana constituída entre 1943 e 1944 para conduzir operações irregulares na Birmânia (atual Myanmar) contra os japoneses.
Embora não tivesse oferecido condições para o desencadeamento de OpESp, a Guerra da Coréia (1950-1953) teve importância como primeiro campo de experimentação para a OPW. 


Figura 2: Insígnia dos SFG-A usado sobre o distintivo identificador da unidade junto à boina. Expresso em latim  o lema (Para Libertar os Oprimidos) que aparece ao longo do viés remete ao modo de agir (Ação Indireta) das FEsp  norte-americanas. (Fonte: Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/Special_Forces_(United_States_Army) Acesso em: 13 ago. 2016).

Em junho de 1952, sob o comando do Coronel Aaron Bank, foi criado o 10th SFG-A (10° Grupo de Operações Especiais-Aerotransportado [10th Special Forces Group-Airborne]) foi ativado. A unidade recém instituída reunia um grupo heterogêneo de voluntários oriundos de diferentes unidades do Exército, incluindo soldados jovens inexperientes e veteranos de conflitos passados.
A eclosão de uma revolta trabalhista, perpetrada por operários da construção civil na Alemanha Oriental em junho de 1953, tornou-se generalizada incitando a população contra o governo. Ainda que o levante tenha sido rápida e violentamente reprimido pelas autoridades locais (com ajuda de forças soviéticas), o evento despertou a atenção do Exército norte-americano para a necessidade de dispor de tropas na Europa a fim de responder prontamente às situações de crise. Diante dessa exigência, grande parte do contingente do 10th SFG-A foi desdobrado para a Alemanha, permanecendo nos EUA um pequeno grupo de oficiais e graduados (sargentos), além de soldados recém-integrados e/ou com pouco treinamento. Em setembro do mesmo ano, esses remanescentes acabariam por constituir o 77th SFG-A (para adequar-se à configuração estabelecida pelo Exército, essa unidade seria redesignada como 7th SFG-A em maio de 1960).
Historicamente, desde sua gênese, os SFGs foram estruturados de forma particular, sendo organizados em diferentes equipes denominadas ODA (Destacamento Operacional Alpha [Operational Detachment Alpha]). Também conhecidos como “A-Team”, cada ODA era constituído por 12 homens distribuídos conforme sua MOS (Especialidade Ocupacional Militar [Military Occupational Specialty]): operações; inteligência; armamentos; comunicações; engenharia; saúde. Além de suas especialidades, cada operador deveria ser versado em operações de contra insurreição, recrutamento político de população civil, instrução militar de guerrilheiros e incursões de profundidade na retaguarda do inimigo com o suporte de irregulares locais. Na estrutura organizacional dos SFGs, quatro ODA reunidos formavam um ODB ou B-Team, enquanto três ODB compunham um ODC ou C-Team.


Fotografia 2: Quadros operacionais de um ODA (Destacamento Operacional Alpha) do 5th SFG-A posam para foto obtida no Vietnã. (Fonte: Disponível em: http://www.onesixthwarriors.com/forum/attention-detail-1-1-talk/45875-there-any-real-african-american-special-forces-guys.html Acesso em: 13 ago. 2016)

A partir da segunda metade da década de 1950, temendo os reflexos dos movimentos insurrecionais de libertação na região sudeste do continente asiático, muitos dos quais eram motivados pela crescente influência soviética, o governo norte-americano decidiu enviar homens do 77th SFG-A para operar em diferentes países da Ásia. Nesse período seria ativado na cidade japonesa de Okinawa o 1st SFG-A.
Foi durante o governo do presidente John Fitzgerald Kennedy (1961-1963) que as FEsp norte-americanas sofreram grande incremento. Em 1961, em uma visita oficial a Fort Bragg, Kennedy mostrou-se positivamente impressionado com as capacidades na condução da modalidade de guerra não convencional demonstradas pelo 7th SFG-A. Convicto de que àquela modalidade de enfrentamento era a mais adequada para o tipo de guerra que se configurava no cenário internacional, o presidente determinou a expansão das Forças Especiais. A iniciativa presidencial deu origem ao 5th SFG-A (1961), 3th, 6th e 8th SFG-A (1963). A visita do presidente Kennedy acabou por formalizar o uso da simbólica “boina verde”, usada até então pelos quadros operacionais das FEsp de forma não-oficial.
Instituídas em 1959 inicialmente como tropas inativas (reserva) do Exército e da Guarda Nacional (força militar de reserva estacionada em todos os estados do país sob comando dos respectivos governadores) pequenas unidades de FEsp sofreram uma expansão em 1961 por ocasião da decisão presidencial, passando a formar o 2nd; 9th, 11th, 12th, 13th, 17th e 24th SFG-A da reserva do Exército, além do 16th, 19th, 20th e 21st SFG-A da reserva da Guarda Nacional. Posteriormente (1966), esses grupos acabariam se fundindo para formar o 11th e 12th SFG-A da reserva do Exército, além do 19th e 20th SFG-A da Guarda Nacional. 


Continua...

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